Gastrointestinais

Qual a prevalência de sintomas gastrointestinais em pacientes com Covid-19?

 

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O SARS-CoV-2 é um novo vírus de RNA de cadeia única, descoberto em dezembro de 2019, pertencente à família dos Coronavírus, com 79,5% de homologia com o vírus SARS-CoV. A doença pelo Coronavírus 2019 (Covid-19) apresenta grande espectro de gravidade, sendo tipicamente caracterizada por febre, tosse, fadiga, anosmia e dispneia. Sabe-se que o vírus inicia a infecção de células alvo humanas através da ligação a receptores da enzima conversora de angiotensina 2 (ECA2), os quais estão presentes nas células epiteliais biliares, hepáticas e enterócitos, especialmente de íleo e cólon. Dessa forma, o trato gastrointestinal pode ser afetado pelo SARS-CoV-2 e atuar como rota de infecção. A eliminação do vírus pelas fezes de pacientes infectados é descrita, mas não se sabe o real impacto da transmissão por via fecal-oral, principalmente no ambiente nosocomial e clínicas de endoscopia.

Recentemente, foram publicados dois importantes estudos sobre sintomas gastrointestinais associados a Covid-19, com intuito de caracterizar melhor essas manifestações.

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Estudos sobre sintomas gastrointestinais na Covid-19

Parasa e colaboradores avaliaram 4.805 pacientes com Covid-19, incluídos em 29 estudos. Os autores demonstraram uma prevalência de 7,8% (IC 95% 5,1%-11,9%) de diarreia e 3,9% (IC95% 2,1%-7,2%) de náuseas e vômitos. Dentre as enzimas hepáticas, a aspartato aminotransferase (AST) estava aumentada em 20% (IC 95% 15,3%-25,6%) dos pacientes, quando a alanina aminotransferase (ALT) em 14,6% (IC 95% 12,8%-16,6%). A presença de RNA viral nas fezes foi detectada em 40,5% (IC 95% 27,4%-55,1%) das amostras, de acordo com registros de 8 estudos analisados. Os pesquisadores estimaram ainda uma prevalência de manifestações gastrointestinais na Covid-19 de 10 a 12%, com detecção de RNA viral nas fezes de 30 a 50% dos pacientes.

Já Sultan e colaboradores avaliaram 10.676 pacientes com Covid-19 incluídos em 43 estudos, sendo demonstrada prevalência de diarreia muito semelhante ao estudo anterior, cerca de 7,7% (IC95% 7,2%–8,2%). Os autores observaram, no entanto, maior prevalência do quadro diarreico em pacientes hospitalizados (10,4%; IC95% 9,4%–10,7%). A diarreia se apresentou como um dos sintomas iniciais em 9,3% (IC95% 8,6%–9,9%) dos indivíduos e teve duração média de 4 dias. Já a presença de náuseas e vômitos foi avaliada em 5955 pacientes, com prevalência de 7,8% (IC 95% 7,1%–8,5%). A dor abdominal foi descrita em 3,6% (IC 95% 3,0%–4,3%) de 4031 casos reportados. Com relação ao perfil hepático, observou-se elevação AST, ALT e bilirrubinas, acima do limite superior da normalidade, em 15,0% (IC95% 13,6%–16,5%), 15,0% (IC95% 13,6%–16,4%) e 16,7% (IC95% 15,0%–18,5%) dos pacientes, respectivamente.

Conclusão

Os sintomas gastrointestinais são relativamente frequentes na Covid-19, podendo anteceder os sintomas respiratórios e ser as únicas alterações apresentadas pelos pacientes.

A eliminação de RNA viral nas fezes ascende o alerta para necessidade de uso adequado de equipamentos de proteção individual no cuidado de pacientes internados. Ainda é preciso definir melhor os riscos de transmissão por essa via. Os estudos devem ser interpretados com cautela.

Deve-se destacar que vários tratamentos em teste para Covid-19 podem causar sintomas gastrointestinais e alterações da bioquímica hepática, especialmente o Remdesivir e Lopinavir/ritonavir. Além disso, a grande maioria dos estudos é observacional, o que pode impactar em diversos vieses de registro e memória, levando a subnotificação de sintomas leves.

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Referências bibliográficas:

  • Parasa S, et al. Prevalence of gastrointestinal symptoms and fecal viral shedding in patients with Coronavirus disease 2019: a systematic review and meta-analysis. JAMA Network Open. 2020;3(6):e2011335.
  • Sultan S, et al. AGA Institute rapid review of the gastrointestinal and liver manifestations of Covid-19, meta-analysis of international data, and recommendations for the consultative management of patients with Covid-19. Gastroenterology. 2020. doi: 10.1053/j.gastro.2020.05.001 [ahead of print].