A literatura científica sobre a COVID-19, com foco nas apresentações clínicas da doença, tem mostrado que lidamos com uma doença efetivamente sistêmica, atingindo não só o aparelho respiratório, mas também os rins, o aparelho cardiovascular, o sistema de coagulação, entre outros.
Na base desses acometimentos estaria uma potente síndrome inflamatória, provocando sintomas e sinais em muitos aparelhos e sistemas do corpo humano.
O artigo COVID-19 cytokine storm: the interplay between inflammation and coagulation, fala da "cytokine storm” - a superprodução de citocinas em uma reação precoce pró-inflamatória -, que resulta no que tem sido descrito como uma tempestade de citocinas, levando ao risco aumentado de hipermaleabilidade vascular, falência de múltiplos órgãos e, finalmente, morte, quando as altas concentrações de citocinas não diminuem ao longo da evolução clínica do paciente. Essa compreensão da patogenicidade permite aos profissionais de saúde envolvidos no cuidado um raciocínio clínico abrangente.
Sídrome da tempestade de Citocinas na COVID-19
Fonte: Shimabukuro-Vornhagen, A., Gödel, P., Subklewe, M. et al (2020)
A pesquisadora em Saúde Pública do Centro de Pesquisas Gonçalo Moniz (CPqGM-FIOCRUZ/BA), Natalia Machado Tavares fala sobre a Síndrome da Tempestade de Citocinas
Para a médica Patrícia Rocco, chefe do Laboratório de Investigação Pulmonar da UFRJ, membro da Academia Nacional de Medicina e da Academia Brasileira de Ciências, o paciente com confirmação ou suspeita de COVID-19 deveria contar com uma série de exames para detectar alterações vasculares e inflamatórias, sejam de imagens, como tomografia, ou de sangue, nos quais se buscam marcadores inflamatórios e de risco para trombose. Patrícia Rocco investiga biomarcadores específicos, substâncias presentes no sangue que podem sinalizar risco de agravamento da COVID-19. Em entrevista ao jornal on-line O Globo, a médica observou: “Hoje não temos um protocolo de avaliação rápida, e isso custa vidas.
Na mesma matéria (Novos sintomas da Covid-19 enganam médicos e mostram outra face da doença), temos:
A infecção pelo coronavírus passou a ser associada à formação de microtrombos pelo corpo, inclusive no cérebro. Uma hipótese para isso é que os receptores usados pelo coronavírus para invadir as células existam em muitos órgãos, principalmente nos vasos sanguíneos. As células que revestem os pulmões estão cheias deles, mas eles também estão no intestino, nos rins e no coração, por exemplo. O que era vista como uma doença respiratória se mostrou uma síndrome preponderantemente vascular —frisa o hematologista e oncologista Daniel Tabak, da Academia Nacional de Medicina, que monitora a evolução da COVID-19 no Brasil. São essas complicações vasculares que têm sido associadas a AVCs e alterações cardíacas graves mesmo em pacientes jovens.
O reconhecimento da SRAG torna-se ainda mais complexo pelos relatos científicos recentes de uma “hipóxia silenciosa”, situação caracterizada por sintomas ainda leves em relação ao grau de hipoxemia, já bastante grave.