PESQUISA DE Vibrio cholerae
BRASIL. Instrução Normativa n°. 62 de 26 de agosto de 2003. Análises microbiológicas para controle de produção de origem animal e água. Diário Oficial da União, Brasília, 18 set. 2003.
1. OBJETIVOS E ALCANCE
Estabelecer procedimento para a pesquisa de Vibrio cholerae em alimentos;
A metodologia para detecção de Vibrio cholerae destina-se à verificação da presença deste patógeno em alimentos de origem animal.
2. FUNDAMENTOS
2.1 Pré-enriquecimento: Baseia-se na recuperação das células, fisiologicamente lesadas ou não, e crescimento em meio não seletivo.
2.2 Etapa presuntiva: Baseia-se no isolamento das colônias em meio sólido seletivo, ágar TCBS, e em meio não seletivo, ágar gelatina, e posterior incubação a 36 ± 1ºC, sendo as colônias típicas submetidas à identificação bioquímica.
O ágar TCBS apresenta, em sua composição, elevada concentração de tiosulfato e citrato de sódio, além de ser altamente alcalino, inibindo assim o crescimento das enterobactérias. A bile e o colato de sódio inibem os enterococos. Como indicador de pH, o meio possui o azul de timol e o azul de bromotimol, que provocam a mudança de coloração do meio para amarelo quando da fermentação da sacarose presente no meio, com conseqüente formação de ácido.
2.3 Provas de identificação: A identificação de Vibrio cholerae é feita por meio de provas bioquímicas, sorológicas e tintoriais.
3. REAGENTES E MATERIAIS
Vidraria e demais insumos básicos obrigatórios em laboratórios de microbiologia de alimentos;
Ágar sal triptona (T1N1);
Ágar ferro dois açúcares (ágar Kligler);
Ágar tiosulfato citrato sacarose sais biliares (ágar TCBS);
Ágar soja triptona (TSA);
Ágar gelatina (AG);
Água peptonada alcalina pH 8,5 ± 0,1;
Caldo peptonado sem sal;
Caldo peptonado sal 3%;
Caldo peptonado sal 6%;
Caldo vermelho de fenol base;
Caldo gelatina fosfato sal (GPS);
Caldo vermelho de fenol manitol;
Caldo vermelho de fenol sacarose;
Meio O/F Hugh-Leifson;
Bacto Vibrio cholerae - anti-soro polivalente;
Arabinose;
Desoxicolato de sódio;
L-arginina;
L-inositol;
L-lisina;
L-ornitina;
Manitol;
Manose;
Reativo para oxidase (oxalato de para-amino-dimetilanilina ou N'N'N'N'-tetrametil-parafenileno-diamina) ou tiras para teste de oxidase;
Etanol 96%;
Reagentes para coloração de Gram;
Óleo mineral estéril.
4. EQUIPAMENTOS
Equipamentos básicos obrigatórios em laboratórios de microbiologia de alimentos.
5. PROCEDIMENTOS
5.1 Enriquecimento: Preparar a amostra de acordo com as instruções contidas no Anexo V, “Procedimentos para o preparo, pesagem e descarte de amostras", deste Manual.
Pesar, separadamente, 25 ± 0,2 g da amostra em dois recipientes estéreis.
Adicionar 225 mL de água peptonada alcalina pH 8,5 a um dos recipientes e 225 mL de caldo gelatina fosfato sal (GPS) ao outro.
Homogeneizar, no máximo por 60 segundos em “stomacher”.
Incubar os caldos a 36 ± 1ºC por 6 a 8 horas.
Para amostras de ostras, inocular um terceiro recipiente com 25 ± 0,2 g de amostra e 225 mL de água peptonada alcalina pH 8,5, que deverá ser incubado por 6 a 8 horas a 42 ± 0,2ºC.
Não agitar os frascos após a incubação.
5.2 Procedimentos de controle; Aplicar os procedimentos de controle específicos estabelecidos pelo laboratório.
5.3 Inoculação; Após a incubação, com auxílio de alça de níquel-cromo descartável, estéril ou de platina, transferir uma alçada de 3 mm de diâmetro, retirada da superfície de cada cultivo, para placas de ágar tiosulfato citrato sais biliares sacarose (TCBS) e de ágar gelatina (AG).
Incubar as placas em posição invertida a 36 ± 1ºC por 24 horas.
5.4 Leitura; Verificar o aparecimento de colônias típicas.
No ágar TCBS, as colônias de Vibrio cholerae apresentam-se com coloração amarela, ligeiramente elevadas no centro, com bordas translúcidas e 2 a 3 mm de diâmetro.
Algumas cepas lento-fermentadoras da sacarose se apresentam verdes no TCBS, após 24 horas de incubação.
No ágar gelatina, as colônias de Vibrio cholerae apresentamse como colônias transparentes com uma zona opaca ao seu redor que, geralmente, torna-se mais nítida após alguns minutos sob refrigeração.
5.5 Provas preliminares para a identificação do Vibrio cholerae
5.5.1 Preparo do inóculo: Selecionar 3 ou mais colônias de cada placa dos diversos meios.
Repicar cada colônia para um tubo com ágar sal triptona (T1N1) inclinado.
Incubar a 36 ± 1°C por 24 horas.
5.5.2 “String Test”; Colocar uma gota (grande) de solução de desoxicolato de sódio 0,5 % sobre uma lâmina.
Retirar uma alçada da cultura mantida em T1N1 inclinado (5.5.1) e suspendê-la na gota.
O aparecimento, em cerca de um minuto, de uma massa mucóide, que forma um filamento quando a alça é suspensa a uma altura de 2 a 3 cm da lâmina (“string” test positivo), é presuntivo da presença de Vibrio cholerae.
5.5.3 Prova da oxidase.
Usando palitos de madeira, de plástico descartáveis ou pipetas Pasteur, estéreis, ou alça de platina, realizar a prova de oxidase espalhando a cultura sobre papel filtro impregnado com o reativo para oxidase, ou sobre tiras de papel para teste de oxidase, comercialmente disponíveis.
Fazer a leitura em 10 a 20 segundos. Após este tempo, podem ocorrer reações falso-positivas.
O aparecimento de cor azul (N'N'N'N'-tetrametil-parafenileno-diamina) ou vermelho intenso (oxalato de para-amino-dimetilanilina) é indicativo de reação positiva.
Não utilizar alças de níquel-cromo ou alças de aço para realizar a prova de oxidase, pois traços de óxido de ferro na superfície flambada podem produzir reação falso-positiva.
O Vibrio cholerae é oxidase positiva.
5.5.4 Coloração de Gram: A partir da cultura mantida em T1N1, fazer um esfregaço e corar pelo método de Gram, de acordo com as instruções contidas no Anexo VII, “Procedimentos de coloração”, deste Manual.
O Vibrio cholerae apresenta-se como bastonete Gram negativo, reto ou curvo.
5.5.5 Leitura: Serão consideradas como suspeitas de Vibrio cholerae as colônias que forem oxidase positiva, "String Test" positivo e se mostrarem ao microscópio como bastonetes Gram negativos, retos ou curvos.
5.6 Provas para a identificação de Vibrio cholerae
5.6.1 Teste do halofilismo: A partir da cultura mantida em T1N1, com auxílio de agulha de níquel-cromo ou de platina, inocular tubos contendo caldo peptonado sem sal, tubos contendo caldo peptonado sal 3% e caldo peptonado sal 6%.
Incubar a 36 ± 1ºC por 24 horas.
Após o período de incubação, observar a presença de turvação nos meios.
O Vibrio cholerae cresce na ausência e na presença de 3% de sal e não cresce na presença de 6% de sal.
Esta prova permite a diferenciação entre Vibrio cholerae e Vibrio alginolyticus, pois o primeiro cresce na ausência de sal, o que não acontece com o segundo.
Observação: Reservar o tubo com o caldo peptonado sal 3%, que servirá de inóculo para outras provas de identificação.
5.6.2 Ágar ferro dois açúcares (Kligler): A partir das culturas mantidas em T1N1, com auxílio de uma agulha de níquel-cromo ou de platina, inocular o ágar Kligler mediante picada central profunda, estriando na superfície inclinada do bisel.
Incubar a 36 ± 1ºC por 18 a 24 horas.
Neste meio, o Vibrio cholerae fermenta a glicose presente, produzindo a acidificação da base (amarela), sem produção de gás (sem bolhas) nem de H2S (sem enegrecimento). Por não metabolizar a lactose, produz uma alcalinização no bisel (vermelho).
5.6.3 Fermentação da sacarose: A partir da cultura mantida em caldo peptonado sal 3%, com auxílio de alça de níquel-cromo ou de platina, inocular um tubo contendo caldo vermelho de fenol-sacarose.
Cobrir o meio com 1 a 2 mL de óleo mineral, ou vaselina líquida, estéril.
Incubar a 36 ± 1ºC por 18 a 24 horas.
Após o período de incubação, observar a mudança de coloração do meio de vermelho para amarelo, devido à fermentação da sacarose e produção de ácido.
O Vibrio cholerae fermenta a sacarose.
5.6.4 Descarboxilação da lisina: A partir do inóculo mantido em caldo peptonado sal 3%, com auxílio de alça de níquel-cromo, inocular um tubo contendo caldo lisina.
Inocular também um tubo de meio base (sem lisina), que servirá de controle para a produção de ácido a partir da glicose contida no meio.
Cobrir os tubos com 1 a 2 mL de óleo mineral, ou vaselina líquida, estéril.
Incubar a 36 ± 1ºC por no máximo 4 dias, juntamente com um tubo de caldo lisina, não inoculado e coberto por óleo, que servirá de controle negativo.
Examinar os tubos todos os dias.
Durante o período de incubação, a cor do meio passa para amarela devido à fermentação da glicose e, ocorrendo a descarboxilação da lisina, o meio retorna à cor púrpura devido à produção de aminas primárias e dióxido de carbono.
O tubo controle, sem aminoácido, deve virar para amarelo e assim permanecer.
O Vibrio cholerae descarboxila a lisina.
5.6.5 Leitura: Serão consideradas como suspeitas de Vibrio cholerae as colônias que apresentarem as características abaixo, que deverão ser confirmadas por meio de provas adicionais.
Kligler - Bisel vermelho (alcalino)
Kligler - Base amarela sem gás (ácida)
Kligler - Sem enegrecimento (H2S negativo)
Sacarose - Positiva
Lisina descarboxilase - Positiva
Caldo peptonado sem sal - Crescimento
Caldo peptonado sal 3% - Crescimento
Caldo peptonado sal 6% - Sem crescimento
5.7 Provas adicionais para a identificação do Vibrio cholerae
5.7.1 Prova de Hugh-Leifson glicose (Meio O/F): A partir do inóculo mantido em T1N1, com auxílio de agulha de níquel-cromo ou de platina, inocular dois tubos contendo meio de Hugh-Leifson glicose.
Cobrir um dos tubos com 1 a 2 mL de óleo mineral, ou vaselina líquida, estéril.
Incubar os tubos a 36 ± 1ºC por 24 a 48 horas.
Após o período de incubação, verificar a viragem de cor dos meios de verde para amarelo e a presença de gás nos tubos de Durhan.
A cor amarela em ambos significa fermentação da glicose. A presença de cor amarela somente no tubo sem óleo mineral significa utilização oxidativa da glicose.
O Vibrio cholerae fermenta a glicose sem produção de gás, por isto ambos os tubos devem apresentar coloração amarela, sem gás.
5.7.2 Prova da fermentação do manitol: A partir da cultura mantida em caldo peptonado sal 3%, com auxílio de alça de níquel-cromo ou de platina, inocular um tubo contendo caldo vermelho de fenol manitol.
Cobrir o meio com 1 a 2 mL de óleo mineral, ou vaselina líquida, estéril.
Incubar a 36 ± 1ºC por 24 a 48 horas.
Após o período de incubação, observar a mudança de coloração do meio de vermelho para amarelo, o que indica a fermentação do manitol.
O Vibrio cholerae fermenta o manitol.
5.7.3 Prova da fermentação da arabinose: A partir da cultura mantida em caldo peptonado sal 3%, com auxílio de alça de níquel-cromo ou de platina, inocular um tubo contendo caldo vermelho de fenol arabinose.
Cobrir o meio com 1 a 2 mL de óleo mineral, ou vaselina líquida, estéril.
Incubar a 36 ± 1ºC por 18 a 24 horas.
Após o período de incubação, observar a mudança de coloração do meio de vermelho para amarelo, o que indica a fermentação da arabinose.
O Vibrio cholerae não fermenta a arabinose, portanto o meio deve permanecer vermelho.
5.7.4 Prova da fermentação da manose: A partir da cultura mantida em caldo peptonado sal 3%, com auxílio de alça de níquel-cromo, de platina ou descartável estéril, inocular um tubo contendo caldo vermelho de fenol manose.
Cobrir o meio com 2 a 3 mL de óleo mineral, ou vaselina líquida, estéril.
Incubar a 36 ± 1ºC por 24 a 48 horas.
Após o período de incubação, observar a mudança de coloração do meio de vermelho para amarelo, o que indica a fermentação da manose.
O Vibrio cholerae fermenta a manose.
5.7.5 Prova da fermentação do inositol: A partir da cultura mantida em caldo peptonado sal 3%, com auxílio de alça de níquel-cromo ou de platina, inocular um tubo contendo caldo vermelho de fenol inositol.
Cobrir o meio com 1 a 2 mL de óleo mineral, ou vaselina líquida, estéril.
Incubar a 36 ± 1ºC por 24 a 48 horas.
Após o período de incubação, observar a mudança de coloração do meio de vermelho para amarelo, o que indica a fermentação do inositol.
O Vibrio cholerae não fermenta o inositol, portanto o meio deve permanecer vermelho.
5.7.6 Prova da descarboxilação da ornitina: A partir da cultura mantida em caldo peptonado sal 3%, com auxílio de alça de níquel-cromo ou de platina, inocular um tubo contendo caldo ornitina.
Semear também um tubo de meio base (sem ornitina) para controle.
Cobrir os tubos com 1 mL de óleo mineral, ou vaselina líquida, estéril.
Incubar a 36 ± 1ºC por no máximo 4 dias, juntamente com um tubo de caldo ornitina não inoculado e com óleo, que servirá de controle negativo.
Examinar os tubos todos os dias.
Durante o período de incubação, a cor do meio passa para amarela devido à fermentação da glicose, e, ocorrendo a descarboxilação da ornitina, o meio retorna à cor púrpura devido à produção de aminas primárias e dióxido de carbono. O tubo controle, sem aminoácido, deve virar para amarelo e assim permanecer.
O Vibrio cholerae descarboxila a ornitina.
5.7.7 Prova da hidrólise da arginina: A partir da cultura mantida em caldo peptonado sal 3%, com auxílio de alça de níquel-cromo ou de platina, inocular um tubo contendo caldo arginina.
Semear também um tubo de meio base (sem arginina) para controle.
Cobrir os tubos com 1 mL de óleo mineral, ou vaselina líquida, estéril.
Incubar a 36 ± 1ºC por no máximo 4 dias, juntamente com um tubo de caldo arginina não inoculado e óleo, que servirá de controle negativo.
Examinar os tubos todos os dias.
Durante o período de incubação, a cor do meio passa para amarela devido à fermentação da glicose e, ocorrendo a hidrólise da arginina, o meio retorna à cor púrpura devido à produção de aminas primárias e dióxido de carbono.
O tubo controle, sem aminoácido, deve virar para amarelo e assim permanecer.
O Vibrio cholerae não hidrolisa a arginina, portanto ambos os tubos devem permanecer amarelos.
5.7.8 Leitura: Serão consideradas como suspeitas de Vibrio cholerae as colônias que apresentarem as características abaixo, que deverão ser confirmadas por meio do teste sorológico.
Hugh-Leifson (Meio O/F) glicose - Fermentativo
Fermentação do manitol - Positivo
Fermentação da arabinose - Negativo
Fermentação da manose - Positivo
Fermentação do inositol - Negativo
Descarboxilação da ornitina - Positivo
Hidrólise da arginina - Negativo
5.8 Teste sorológico: Marcar duas seções de aproximadamente 1 x 2 cm no interior de uma placa de Petri ou em uma lâmina de vidro de 2 x 3 polegadas ou em uma placa Huddleson.
Colocar uma pequena quantidade da cultura, crescida em ágar T1N1 inclinado, diretamente sobre a placa ou lâmina, na região marcada.
Adicionar uma gota de solução salina 0,85% na parte inferior de cada uma das regiões marcadas. Com auxílio de uma alça ou agulha de níquel-cromo ou de platina, suspender a cultura com solução salina em cada seção.
Adicionar uma gota do anti-soro polivalente de Vibrio cholerae a uma das seções com a suspensão da cultura e misturar com a alça. A outra seção contendo antígeno é somente um controle de autoaglutinação.
Observar a reação em 1 minuto contra um fundo escuro.
Uma reação positiva é indicada por uma aglutinação rápida e forte.
Enviar as culturas que se comportem como Vibrio cholerae, em ágar estoque, para tipificação à Instituição de Referência designada pela CLA.
6. RESULTADO
Serão consideradas como positivas para Vibrio cholerae as culturas que apresentarem os resultados esperados tanto nas provas adicionais de identificação quanto no teste sorológico.
Expressar o resultado como:
Pesquisa de Vibrio cholerae: Presença/25g ou mL; ou
Pesquisa de Vibrio cholerae: Ausência/25g ou mL
7. BIBLIOGRAFIA CONSULTADA
ICMSF. International Commission on Microbiological Specifications for Foods. Microorganismos de los Alimentos – Técnicas de Análisis Microbiológico. V.1. 2.ed. Acribia, Zaragoza - Espanha.
ELLIOT, E.L.; KAYSNER, C.A.; JACKSON, L. e CEBULE, T.A. V. cholerae, V parahaemolyticus, V. vulnificus and Others víbrio spp. In Bacteriological Analytical Manual Online. 2001. Disponível em: http://www.cfsan.fda.gov.
KAYSNER, C.A.; DePAOLA, A. Vibrio . In: Compendium of Methods for the Microbiological Examination of Foods. 4 ed. Frances Pouch Downes & Keith Ito (Eds.), Washington: American Public Health Association, 2001, p. 405 - 420.